A hora da democracia nas empresas

Numa da crônicas do livro Tudo é Comunicação, o jornalista Paulo Nassar afirma: ?Em um ambiente cínico, a comunicação empresarial é um motor sem combustível.? Mais adianta, dardeja: ?Hoje, o que se vê, se lê e se sente nos veículos de comunicação interna é cafezinho frio, manteiga rançosa e pão amanhecido, oferecidos entre as quatro paredes das empresas. ? E diz ainda: ? De nada valem as estratégias modernas e sofisticadas de comunicação e defesa da imagem organizacional, que envolvem ações ligadas à publicidade, responsabilidade ambiental, social e histórica, se elas não chegarem ao pessoal das oficinas, dos escritórios, da ?classe média?, do ?chão da fábrica? e da ?periferia? da empresa ? ou se não são compreendidas por eles.? 

 

Observações como estas feitas por Nassar, respaldadas por duas décadas de vitoriosa experiência, já seriam suficientes para que donos de empresas, executivos e responsáveis pela comunicação das corporações pensassem e repensassem estratégias. Mas se lidas no conjunto do trabalho dão base, sem dúvida, a reflexões de horizontes muito mais amplos. No fundo, o que Nassar quer dizer é que a empresa no sentido tradicional deixou de existir, e há muito, porque nos dias atuais vincados pela intensa competição e marcados pela emergência de cidadãos-consumidores cada vez mais exigentes, a comunicação é tudo e feita por todos.  

 

Ela anota, com perspicácia: ? Dentro do território das empresas trava-se a grande batalha pela boa imagem empresarial. As empresas aprenderam, gastando muito dinheiro e usando muito talento, a fazer publicidade de suas marcas, produtos e serviços. Difícil é fazer ? e bem feita ? a comunicação interna. Aquela que dá resultado.? Não por acaso conta o caso de um empregado que impede um gerente de cortar uma árvore na porta de uma empresa por uma razão de comunicação: como a marca corporativa era inspirada numa árvore o gesto teria certamente péssima repercussão.  

 

O ser e o nada. A comunicação interna é a paixão e a especialidade maior de Nassar,um talentoso paranaense nascido há 51 anos na cidade de Bela Vista do Paraíso, que ensaiou os primeiros passos no universo das empresas na década de 80 como produtor de vídeos. ?Isso me permitiu conhecer as pessoas das empresas, da alta direção ao chão-de-fábrica. Foram quase dez anos trabalhando com criação de vídeos. Fazia de tudo, pegava o briefing, escrevia roteiros, editava e cheguei até a dirigir trabalhos. Essas experiências em videocomunicação se constituíram para mim em uma verdadeira universidade ligada à gestão, ? ele recorda com emoção.  

 

O grande salto viria em 1994, um década atrás, com o livro O que é comunicação Empresarial, Coleção Primeiros Passos, da Brasiliense. A partir de então não parou de escrever e, também de ensinar, transformando as experiências práticas em conceitos teóricos ( e vice-versa), dando vida a novas idéias e influenciando toda uma geração de comunicadores. Nesse diálogo cotidiano, conseguiu ir além das técnicas de Assessoria de Imprensa para acoplá-las à comunicação organizacional.  

 

É essa arte de integrar comunicação, cultura, administração, psicologia organizacional e visão política que faz de Nassar um comunicador singular. Raro, mesmo. É mais do que educativo ler Tudo é comunicação. É enriquecedor. Porque a conclusão final é uma só: ou a empresa tem o que comunicar, e assim o faz, ou desaba no vazio da retórica e cedo ou tarde perderá terreno para os concorrentes.  

 

Verdades e mentiras. O livro de Paulo Nassar reúne 28 crônicas. Algumas são imperdíveis. Em Se você não faz, seu concorrente… ele adverte: ? Um número muito grande de empresas ainda vê e pensa a comunicação de maneira mecanicista?. Mas o verdadeiro problema é outro: se a empresa fica agarrada a velhos conceitos como uma ostra no casco de um navio é inescapável que seu concorrente irá fazer a coisa certa e ultrapassá-la.  

 

A tese é fácil de compreender. A cada dia existe maior número de empresas interessadas em tratar profissionalmente da comunicação. Nassar cita números. Pesquisa da Aberje ? Associação Brasileira de Comunicação Empresarial datada de 2001 mostrava que 48% das empresas brasileiras estavam investindo em diretorias de comunicação.  

 

Paradoxalmente, no ano seguinte a mesma Aberje constatou que sete em cada dez comunicadores estavam insatisfeitos com o seu trabalho. A amostra não poderia ser mais representativa: foi colhida em meio a uma centena de grandes empresas, responsáveis por faturamento de 170 bilhões e com quadro de colaboradores que, juntos, contabilizavam 800 mil empregos.  

 

Nassar trabalha para aplainar as contradições.  

 

Explica: ?A comunicação empresarial é extremamente limitada e limitante. É uma comunicação que subestima os seus públicos. No caso das ações internas, se destaca pelo primarismo dos slogans do tipo ?vista a camisa da empresa?, ?o cliente em primeiro lugar? e coisas do gênero.  

 

Entre os indicadores do ?nosso analfabetismo em comunicação?, Nassar aponta, ? os temas que permeiam o jornalismo empresarial centrados no mundinho da empresa. Dinheiro e tempo jogados fora, já que os trabalhadores, hoje, avaliam e comparam a comunicação da empresa com a comunicação do sindicato, com a comunicação de massa…?  

 

Em síntese, na ótica apurada de Nassar chegou ao fim a era da comunicação de cima para baixo. Aquela inspirada no surrado ditado ?manda quem pode, obedece quem tem juízo?. Por mais que digam o contrário, insiste o comunicador, ?a nossa comunicação ainda é de índole taylorista, mecanicismo puro?. Contra esse tipo de doença passadista, o remédio indicado por nassar é um só: democracia nas empresas. Uma opção difícil, mas não impossível. (Autor do livro Comunicação Empresarial de A a Z, que chega as livrarias em maio-junho pela editora CL&A)
FONTE: Gazeta Mercantil

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