Temos hoje, no Brasil, seguramente, mais de 1.000 agências de comunicação operando regularmente. Se alargarmos um pouco mais nossos critérios do que seja uma operação regular, esse número pode chegar quem sabe a 2.000 agências, aí considerando todos os profissionais com firma aberta e que atuam esporadicamente nesta área. É um número excessivamente alto, mas curiosamente isso não tem sido decisivo para a sobrevivência da esmagadora maioria das empresas em atividade. Aqui mesmo neste espaço, muito já falei de novas empresas, de conquistas de contas, de crescimento de faturamento etc., mas praticamente nunca falei de fechamento de empresas. Não porque não quisesse, mas sim porque realmente esse é um setor que consegue o milagre da sobrevivência, mesmo enfrentando esta forte e irracional competição que se trava no mercado. Uma das conclusões a que podemos tirar desse quadro é tratar-se, o nosso, de um mercado efetivamente generoso, com lugar para todos: desde o pequenininho, que tem lá em seu escritório domiciliar um computador e uma linha telefônica (e nem por isso deixa de realizar um bom, quando não um excelente trabalho), até as médias e grandes do setor, hoje com faturamento se aproximando ou quem sabe ultrapassando os R$ 30 milhões por ano. Realmente é incrível, mas praticamente não se têm no mercado notícias de falência ou de fechamento de agências de comunicação. O contrário, no entanto, é uma constante: a cada semana, uma ou duas agências são criadas e entram nesta roda viva da sobrevivência com muita disposição e vontade de vencer. Uma segunda conclusão desse quadro é que com tantas agências e tanta necessidade de sobrevivência, vale pegar qualquer cliente e pelo preço que for possível pegar. Ou seja, até botequim especializado em coxinha com varizes e pé de moleque com frieira tem direito a ter lá sua assessoria de imprensa, com direito a emissão de pelo menos um press-release por semana e follow-up com as redações para tentar emplacar pelo menos uma notinha. Em outras palavras, esse é um mercado esquadrinhado de norte a sul, leste a oeste. Cada vez mais, só se ganha uma conta, quando alguém a perde ou quando o cliente resolve diversificar e dividir o atendimento. Com tanta quantidade, a qualidade passa a ser um fator seletivo e é nesse quesito que as agências vão se diferenciando uma das outras, fazendo sua imagem e a imagem de seus clientes. Agência boa, com clientes e informações de qualidade, nunca passa em branco quando vai divulgar algo, porque tem um imenso crédito junto aos profissionais de redação. E isso foi recentemente demonstrado numa pesquisa feita em parceria pela Aberje com a revista imprensa e o site Maxpress, dando conta de que diminuiu significativamente o preconceito das redações contra as assessorias. De olho nesse segmento, o próprio Comunique-se acaba de anunciar que vai produzir um ambicioso ranking do setor, com o objetivo de jogar luzes, onde até então só se vêem sombras. O último ranking do setor foi feito pela Gazeta Mercantil, já em meio à crise que quase a levou à falência. Era um ranking pouco confiável, cheio de falhas, mas ainda assim o único existente e por isso muito usado pelo mercado como referência. Agora isso deverá ser corrigido e com isso esse segmento vai finalmente poder se conhecer um pouco melhor, do mesmo modo que o mercado como um todo. Bem, mas não era apenas isso que eu queria falar neste texto, cuja proposta, como destaquei no início e no próprio título, é exercitar a reflexão. Ao olhar esse setor com olhos analíticos e desapaixonados, não é difícil enxergar que ele pode estar em vias de passar por uma profunda reorganização mercadológica, fruto de uma situação empresarial que priorizou, no geral, muito mais a figura do dono do que a da empresa. Houve uma profunda profissionalização no segmento, mas ele continuou majoritariamente integrado por empresas familiares, individualistas e que são a cara e a energia do dono. Se ele morrer, ficar doente ou quiser se desfazer da empresa, o negócio acaba junto. O mais grave é que a maioria desses empresários, já com mais passado do que futuro pela frente, simplesmente não conseguiu preparar herdeiros, não por culpa deles, obviamente, mas porque nessa atividade isso é assim mesmo. São poucas e podem ser contadas talvez nos dedos de uma mão as agências cujos donos conseguiram convencer seus filhos a entrarem no negócio, com a perspectiva de assumirem o comando. A esmagadora maioria nem sequer incentivou os filhos a entrarem para o negócio, pois tem plena consciência de que se trata de uma atividade muito desgastante e ainda com muitos problemas pela frente. Então, o que fazer? Quem leu este artigo até aqui e é da área certamente já inferiu onde quero chegar. Não sou nem nunca pretendi ser o dono da verdade. Modestamente, procuro externar meus pontos de vistas e refletir sobre esse nosso valioso e ao mesmo tempo complexo mercado. E penso que o grande mérito dessas mal traçadas linhas seja realmente a reflexão e o debate. Na minha opinião, o mercado vai passar por um processo natural de depuração. Acredito mesmo que haverá, em cinco ou dez anos, um enxugamento no número de empresas, em decorrência de causas como as que listei. As empresas menos preparadas vão ter cada vez mais dificuldades de pegar bons contratos e as boas vão acabar se fortalecendo cada vez mais. Quanto mais profissionais forem, mais tenderão a crescer. O cenário que vislumbro é o de que comece a acontecer no setor um processo de fusão e incorporação, tal qual em outros setores, com as empresas mais profissionalizadas absorvendo as demais. Uma primeira fusão, aliás, foi registrada recentemente entre a Serrano & Associados, de Luiz Roberto Serrano, e a Intersection, de Cacilda Nunes Casado. Ambos com as dificuldades naturais de empresas de pequeno porte resolveram somar esforços e estrutura para serem mais competitivos. É um dos modelos que, acredito, vá ocorrer. Um outro será a aquisição de agências, cujos donos, cansados ou doentes, querem se desfazer do negócio, sem ter para quem deixá-lo (vale, sobretudo para quem está já na faixa dos 60/65 anos). Também vamos ter pessoas que, embora mais jovem, estejam desencantadas e muito cansadas do estresse dessa atividade. Essas também não resistirão a uma boa proposta, sobretudo se puderem se livrar do ônus de administrar a empresa. Para os ambiciosos, esta também será uma oportunidade inestimável. Quem tiver “café no bule”, como se diz na gíria, e intenção de crescer, vislumbrará múltiplas oportunidades de ampliar o negócio, fazendo com que ele fique cada vez mais profissional e empresarial e menos pessoal. Imagino também a entrada forte de sócios capitalistas, interessados em investir, os quais, aliás, já têm dado, aqui e ali, o ar da graça. E isso não será nada difícil, visto que boa parte desses investidores mantém relacionamento regular com a mídia e com profissionais de assessoria. Ao perceber que há, nesse setor, oportunidade de bons ganhos, os investimentos vão surgir naturalmente. Há, no entanto, uma questão de fundo: como tudo é muito novo no segmento, não existe fórmula ou modelo para esses eventuais negócios (o que se vai efetivamente comprar ou fundir; qual a relação com quem está se desfazendo do negócio; compra-se com dinheiro ou com participação; e assim por diante). Nada, no entanto, que possa inibir um movimento na direção comentada. Vejo esse cenário, caso isso de fato ocorra, como uma evolução natural de um setor que nasceu de forma desordenada e improvisada, lutou, cresceu, se desenvolveu, profissionalizou-se e agora, chegando à maioridade, busca encontrar o modelo de gestão empresarial mais adequado. Chegar lá é apenas uma questão de tempo e perseverança. A menos que eu esteja redondamente equivocado. |
Fonte: Comunique-se
FONTE: Comunique-se