A utilização da arte na construção ou reposicionamento de marca ou empresa.
A arte é uma sublime forma de expressão de um povo, de uma cultura. Seja qual for sua manifestação ? uma tela, uma poesia, um romance, uma música, entre outras formas igualmente importantes ? sua contemplação leva o ser humano a profundas reflexões. Inclusive a respeito de seus próprios valores. Desperta sensações, emociona e também motiva. Há que pensar nela de maneira muito abrangente e sem paradigmas. Nesse amplo sentido, a propaganda, que é uma área do marketing, pode ? e deve! ? ser considerada uma arte. Será tanto mais poderosa e eficaz, quanto mais imbuída de talento, criatividade, imaginação, muito esforço e dedicação de tempo. Claro, tudo isso envolve não só o lado emoção de seus autores, como também o racional, o pensamento. É trabalho de corpo e alma. Exige a presença integral e muito tempo, para que aflore o melhor. Não é um processo simples, automático. Se o produto muitas vezes parece emergir de um insight, vale sempre lembrar que essa exata e fugaz chama resulta de todo um processo.
O que a difere, em essência, das chamadas grandes artes é o fato de não estabelecer valores estéticos e culturais, por voltar-se basicamente à publicidade comercial e à construção de marcas. Sua principal meta, portanto, é vender produtos e posicionar marcas, o que implica criar ou mesmo seguir tendências, o que está em voga. Para cumprir bem seu papel tem de levar em conta, antes de tudo, o comportamento e a atitude dos consumidores e usuários dos produtos. É a partir dessa acurada observação que vem o planejamento e a criação das peças destinadas a comunicar e despertar o interesse do grupo alvo, de maneira a levar as pessoas à compra dos bens que propaga.
Se fosse uma grande arte, ficaria contida em seu próprio universo. Os grandes mestres sempre viveram a arte pela arte, como forma única e inalienável de expressão de seu próprio talento. Um gênio como o espanhol Pablo Picasso nunca pediu aprovação a quem quer que fosse para pintar, desenhar ou esculpir. Ao contrário, ousou, afrontou, escandalizou, inclusive seus pares. Da mesma forma, o extraordinário Rembrandt não deve ter precisado de referências distantes de si, senão tudo o que o movia e emocionava, para deixar o legado que deixou. Igualmente Michelangelo, que apesar de trabalhar a soldo de poderosos e do alto clero, recusava-se a alterar suas criações para atender os anseios do cliente. O que esses artistas ímpares deixaram é eterno, enquanto as campanhas de propaganda, por mais geniais e marcantes que sejam, duram apenas o período necessário a que cumpram os objetivos de marketing. Infelizmente, algumas permanecem mais tempo do que seria recomendável e outras podem até nunca atingir seus alvos. Mas, este não é o foco deste artigo.
A questão é que há como trazer a arte para muito próximo, como ferramenta de marketing com um papel adicional, na atualidade. Claro, se os responsáveis por esse trabalho tiverem a sensibilidade de perceber como é possível utilizar-se dela, a arte, para elevar o valor da marca. Bem desenhada e conduzida, essa pode ser uma estratégia poderosa na alavancagem dos negócios, ao mesmo tempo em que cumpre o papel social de propagar a muito mais gente o que produzem os talentos. Eu me refiro ao uso específico do marketing cultural, na viabilização de exposições e vernissage, ao apoio direto a museus e outras instituições voltadas à cultura.
Isso implica não só o foco em determinados artistas ? e houve quem já abrisse caminho a parcerias com o mundo dos negócios, emprestando sua criatividade a produtos ? como a investir em eventos de grande porte, como foi a exposição na Oca de Picasso, patrocinada com sucesso e responsabilidade pelo Bradesco.
A Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape) informa que as empresas e instituições com prática sistemática de investimento cultural tendem a aumentar, a cada ano, os investimentos destinados a novos projetos. Isso confirma a eficácia e agilidade dessa alternativa. Em 2002, o volume de patrocínio cultural movimentou mais de US$ 25 bilhões em todo o mundo. É uma tendência consolidada. As Américas do Sul e Central representam pouco menos de 10% desse montante, o que significa a existência ai de um grande potencial a ser explorado pela área de marketing.
Diferente de outros segmentos da sociedade, como o esporte, a dança e a música, no Brasil, as artes plásticas ainda estão muito isoladas. O investimento em cultura ainda é pequeno e são muitas as empresas que ainda não compreendem o valor que o marketing cultural pode trazer a elas mesmas e à sociedade. Adicionalmente, é muito saudável a aproximação do artista do mundo das artes com os empresários e os profissionais de marketing. Na interação com o artista, a empresa terá oportunidade de observar e absorver a força da criatividade bem direcionada, a sensibilidade para o ambiente em que vive e as transformações que estão ocorrendo na sociedade. Com o artista, tanto o profissional de marketing como o empresário pode aprender, inclusive, a suavizar seu mundo tão direto e tão duro. Quem sabe, mesmo, a trazer um novo colorido e leveza à duríssima rotina das corporações. Os artistas, por sua vez, podem absorver desse universo pragmático novas formas de interagir com seus admiradores (para não usar a palavra consumidores), sem prejuízo de sua criatividade.
Outra lição possível é que se há prazer na criação também pode haver na comercialização. Quem sabe se abra a oportunidade de quebra de paradigma do ?produzir apenas para? si próprio, com muita dificuldade para se ?desfazer? de sua criação. Afinal, muitos gênios da arte passaram a vida inteira em completa penúria, embora com o anseio de serem aceitos, ou seja, de conseguir vender seus quadros.
Dessa forma há como estabelecer uma relação de crescimento mútuo, em que se consagre o melhor do artista e da empresa. Há casos, já, de artistas que têm consciência da necessidade de se posicionar no mercado com uma clara mensagem sobre a relação que existe entre a arte e o marketing, ou mais fortemente, entre a arte e os negócios. Sabem perfeitamente que a arte pode gerar crescimento, tanto de vendas como de participação no mercado. É o caso da artista plástica Sonia Menna Barreto, com quem tenho o prazer de me relacionar. Considerada uma mulher à frente do seu tempo, no campo em que atua, foi buscar uma agência de comunicação como a Neogama/BHH para obter um posicionamento mercadológico de seu trabalho. Ela entende a arte também como um negócio. Sonia Menna Barreto é considerada uma versão feminina do surrealista Salvador Dali. Entre seus feitos está o de ser a única artista brasileira a ter uma obra incluída na Coleção Real Britânica. Este é um claro indício de que a arte, além de dignificar a existência humana pode, ainda, gerar maior projeção para os negócios e até para o Brasil. Um Viva, portanto, aos artistas e aos profissionais de marketing. Particularmente, viva a Sonia, neste mês de celebração ao Dia Internacional da Mulher. Bravo Sonia!
Amalia Sina
Professora da Fundação Dom Cabral
Autora do Livro ?Mulher e Negócios ? O desafio de conciliar diferentes papéis na sociedade?.