A assessoria e os desvios de mercado

Não é de hoje que surgem, em ocasiões esporádicas, dentro do ambiente da comunicação empresarial e das assessorias de imprensa, algumas ações exóticas e estapafúrdias, que acabam chamando a atenção não exatamente pelo que possam trazer de contribuição efetiva para esse tipo de atividade e sim pelo mal que provocam (ou podem provocar) ao mercado.



Uma dessas ações exóticas, que por incrível que pareça ainda acontece (felizmente em pequena escala e de forma residual), é a prática de agências de propaganda, no afã de ganhar determinadas contas, oferecer no pacote assessoria de imprensa de graça para o cliente – assim como se a assessoria fosse um brinde, um bônus, um serviço menor, pelo qual não valesse cobrar. Lembro perfeitamente de um caso no qual uma das grandes agências de comunicação perdeu um contrato certo porque a agência de propaganda – também grande (e alinhada com uma agência de comunicação concorrente daquela outra) – ofereceu gratuitamente o serviço de assessoria de imprensa dentro do pacote maior que envolvia polpudas verbas daquela organização. Não estamos aqui, pois, falando de empresas de fundo de quintal, mas de grandes empresas.



As agências, tanto de propaganda quanto de comunicação, são das mais conhecidas do mercado e o cliente é uma empresa de grande porte que aparece diariamente na mídia. Como contra números não há argumentos, a empresa pegou o brinde e deu um chega pra lá na outra agência, que cobraria pelo trabalho. Como ninguém é ingênuo, quem acompanhou o caso sabia que naquele pacote oferecido pela tal agência de propaganda já estava embutido um determinado valor que seria repassado (sem que aparecesse como custo independente) para outro fornecedor, já que a agência de propaganda, propriamente, não faz nem tem estrutura de assessoria de imprensa – pelo menos naquele caso não tinha e efetivamente repassou o trabalho para a outra organização.



Práticas como essa são um horror e em nada dignificam essa ou qualquer outra atividade profissional. Se não há como bani-las por via legal, que o façamos por pressão política, para inibir quem se presta a esse tipo de atitude. Afinal não dá para aceitar como normal que se trabalhe de graça para organizações capitalistas com fins lucrativos ou mesmo para outras organizações que, sem fins lucrativos, não sejam instituições filantrópicas. Menos ainda quando essa atitude se configura em concorrência desleal.



Todos sabemos, aliás, que há, hoje, por parte das agências de propaganda, uma certa preocupação com o crescimento do setor de assessoria de imprensa, tanto que algumas mantêm núcleos para dar esse atendimento (às vezes até mesmo como plus – ou seja, de graça) e outras ensaiam estruturar-se para entrar nesse mercado. Até aí, nada de anormal, sobretudo se essa entrada se der via profissionalização e investimentos. O que não é aceitável é que se queira entrar pelas portas do fundo – destruindo ou maculando a imagem de um setor que luta há anos por um lugar ao sol, com muita dignidade, diga-se de passagem. Assessoria de imprensa decididamente não é brinde, nem um trabalho menor. É, sim, uma das mais poderosas ferramentas da comunicação organizacional e deve ser respeitada como tal.



Outro exemplo de ação exótica nessa área? Sim, claro que temos. Aliás é um exemplo em geral cantado em prosa e verso como uma inovação e um benefício para os clientes, pressupondo uma espécie de remuneração por resultados. Visto assim até parece uma coisa boa. Mas tanto não é que nunca vingou. E quem faz esse tipo de proposta é logo chamado de aventureiro e pouco crível pelo próprio mercado. Trocando em miúdos, são as agências de comunicação que se propõem a cobrar pouco ou nada dos clientes como fee mensal, deixando sua remuneração ao sabor das matérias emplacadas na mídia. Desse modo, uma nota cavada na Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, por exemplo, poderia valer "X", uma matéria em Veja "Y", uma reportagem da TV Globo "X + Y" etc.



Muitos de vocês não acreditam que esse tipo de coisa exista no mercado, não é verdade? Pois existe, sim. Aliás, dia desses mesmo um amigo de uma agência me ligou, contanto que, num movimento contrário, ele recebeu essa proposta (indecente) do cliente. A empresa o procurou dizendo que precisava renegociar os valores e que tinha uma idéia de como fazer isso: reduziria o fee mensal e passaria a pagar valores determinados (como numa tabela) por matérias que a assessoria conseguisse na imprensa.



Esse meu amigo, zeloso do negócio, não aceitou sequer conversar com o cliente, abrindo mão da conta. E me confidenciou: "Não aceito por questões éticas, morais, econômicas e de sobrevivência. Imagine só se, caindo em tentação, eu aceitasse um acordo desses e os colegas da imprensa descobrem? Como vou encarar, por exemplo, um César Giobbi se chegar aos seus ouvidos que eu recebo, sei lá, R$ 500,00 por cada nota que consigo na coluna dele? Seria o meu fim no mercado".



E ele está coberto de razão, porque se há uma informação que se propaga como rastilho de pólvora em nosso mercado, essa diz respeito às práticas danosas. E quem se queima, por adotar práticas esdrúxulas como essas, está literalmente morto na atividade. É só uma questão de tempo.



Gênios do mal existem em todas as atividades e na área de comunicação não seria diferente. Às vezes nem tão do mal assim são, pecando talvez mais por ingenuidade do que por intenção.



Um terceiro exemplo que podemos lembrar é a prática das chamadas concorrências marcadas. Um horror. Aquelas em que o negócio já está acertado, mas que é preciso ser justificado por uma concorrência… fajuta! Isso vale para a área pública e também para aquelas instituições que são regulamentadas por estatutos que exigem licitação, tomadas de preços ou concorrências para os serviços contratados. A lei ou os estatutos são até bem intencionados, porque buscam obrigar os compradores ou contratantes a comprar o melhor produto ou serviço pelas melhores condições econômicas. Na prática, infelizmente nem sempre é assim. Seja porque os editais nem sempre primam pela inteligência, ou seja porque a inteligência dos gênios do mal sempre encontre um jeito de driblar as boas intenções do que está escrito e proposto.



Como sou daqueles que acreditam que o bem, ao final, sempre triunfará, acho que esses maus exemplos apenas reforçam a necessidade de nos mirarmos nas boas práticas de mercado, para que elas, sim, sirvam de exemplo e balizem nosso mercado. As más, como essas aqui citadas, só precisam ser combatidas e desestimuladas. Já estaremos dando passo certeiro no caminho da cidadania.


FONTE: Comuniquese

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