Bem, voltando à vaca fria, vou falar mais um pouco sobre assessorias de imprensa. Como você deve lembrar, comecei a série admitindo a minha mudança de ponto de vista sobre assessor de imprensa exercer função jornalística – antes acreditava que sim e agora creio que não.
Essa nova visão, porém, não desmerece em nada o trabalho do assessor. Na segunda coluna, em cima de um emeio enviado por coleguinha a respeito da primeira, escrevi sobre a minha crença de que o jornalista institucional – também conhecido como assessor de comunicação ou de imprensa – é um profissional importante no quadro da democracia contemporânea.
Esta importância, porém, deve vir acompanhada de algumas regras básicas, de uma deontologia (definida no Houaiss como "conjunto de deveres profissionais de qualquer categoria profissional minuciados em códigos específicos") a ser seguida com rigidez. Mais uma vez aquela colega citada na segunda coluna vem em meu auxílio. Veja de novo o simpático emeio que ela me mandou:
"Caro colega,
Li o texto Repensando Assessorias. Não tenho a intenção de polemizar o assunto até porque acho que esse é um tema que ainda renderá muitas interrogações, que precisam numa ampla discussão, sem ofensas, serem respondidas e os ponteiros acertados entre os jornalistas de redação de um jornal e os das assessorias de imprensa.
Por causa de vários fatores desempenho as duas funções (assessor e repórter diário). Quero apenas dizer que o que me impulsionou a fazer jornalismo foi saber que a profissão é um braço da democracia e que pode
contribuir, e muito, com pleno exercício da cidadania. Procuro, sempre que existem brechas, fazer meu papel de cidadã porque assim me sinto bem."
A primeira regra deontológica de um profissional de jornalismo institucional é que ele/ela, creio, não pode ser, ao mesmo tempo, empregado de uma empresa jornalística. Essa jornada dupla deixa o profissional muito vulnerável a pressões, tanto de um lado como de outro.
Mesmo que o/a colega trabalhe numa editoria no veículo de comunicação (por exemplo cultura) e a instituição a que presta serviço de assessoria seja de outro campo (por exemplo economia), ainda assim as pressões estariam presentes, já que apenas a presença física do/da profissional nos dois lados propiciaria oportunidades para que ele/ela fosse pressionado/a.
O conflito de interesses pode parecer óbvio no eixo Rio-São Paulo-Brasília, mas parece não ser o caso em outros locais do Brasil (a propósito, não sei de onde é a colega que me escreveu). Há que se observar que, fora dos três grandes mercados, as condições de emprego e salário dos jornalistas são em muito inferiores às existentes nas três cidades citadas (que já não são lá muito boas). Este fator deve ser levado em consideração com cuidado, mas, em minha opinião, ainda assim não pode ser determinante, já que está em jogo a credibilidade de duas funções, a de jornalista e a de assessor.
Este é um exemplo bastante claro da necessidade de ser escrito um código em que estejam claras algumas definições sobre o "fazer assessoria", um texto que abranja diretamente questões como a levantada por um outro colega sobre um jornalista que se torna assessor e depois volta para redação de posse de informações mais ou menos confidenciais de uma empresa. Ele tem direito de usar estas informações, obtidas quando ele estava sob contrato de outra empresa, em seu novo emprego?
Como esta, certamente outras questões deveriam ser debatidas por profissionais, empresas e sindicatos e outras instituições envolvidas não só no dia-a-dia das assessorias, mas também por aquelas com responsabilidade por formar os profissionais, como as universidades. É uma tarefa enorme, bem sei, mas já está passando da hora de começarmos a enfrentá-la.
SS, Contigo e Elmore – Você já leu algum livro de Elmore Leonard? Se não leu, devia. Ele é um dos mestres da literatura policial americana e na maior parte dos seus livros há malandros de segunda, terceira ou quarta que, em busca do grande golpe ou apenas de mais uma maracutaia que garanta seis meses de boa vida, acaba por entrar em encrencas que acabam sendo maiores do que a capacidade deles de lidar com elas (ou não, pois às vezes se mostram à altura da situação).
Lembrei de Leonard nessa história do Silvio Santos com a Contigo. A revista foi fazer uma matéria típica de Contigo: fofoca de "famoso" sem maiores conseqüências. Só que, como num enredo leonardiano, acabou topando com algo grande, no caso a suposta venda do SBT para o Boni e a Televisa devido a mais suposta ainda "doença terminal de seis anos de duração" do SS.
Como alguns dos personagens do escritor americano, a Contigo até se saiu bem – vendeu que nem água -, mas nem tanto: o pouco que tinha de credibilidade se foi de vez – agora, mesmo quando afirmar que água é molhada, a revista será posta em dúvida pelos seus leitores. Embora eles não liguem muito de saber se o que está escrito ali é ou não verdade.
Quanto ao jornalismo propriamente dito, não vejo, como muitos, que ele tenha sido mortalmente atingido em sua honra. Contigo e outras revistas do tipo fazem um jornalismo que não pode ser (e não é) levado a sério.
Ele existe para suprir uma necessidade de uma determinada fatia de público, cuja exigência de verossimilhança é pequena, que lê as reportagens em suas páginas mais como "romance do real" do que como verdade verdadeira.
O problema, na verdade, não é que a Contigo tenha feito o que fez – publicar algo em que não acreditava e ainda por cima sem checar direito – pois isto ela faz em todas as edições. O grave é que algumas publicações ditas sérias estão enveredando pelo caminho. Mas isso é papo para outra ocasião.
Mais do mesmo – Mais doses de veneno paranóico, turbinadas com outras análises tresloucadas e, até, informações relevantes? Então assine o devezemquandário Coleguinhas Por Mail, mandando emeio para cpm@coleguinhas.jor.br. Não tem mais burocracia que isso (bem, tem umazinha do yahoo, mas é indolor…) e, melhor de tudo, é "de grátis"!
FONTE: Comuniquese