Quando eclodiu a crise dos empréstimos subprime nos Estados Unidos, ponta do iceberg da atual crise econômica mundial, a revista Fortune encapou a perplexidade da opinião pública americana. A capa de sua edição de 3 de dezembro de 2007 mostrava os quarto presidentes de bancos americanos que acabavam de revelar perdas bilionárias com créditos de alto risco. Junto de suas fotos e os valores das perdas de cada um, o título agressivo: “O que é que eles estavam fumando?”
Não prever nem monitorar vulnerabilidade e riscos potenciais ou, pior ainda, não levá-los a sério, é meio caminho andado para a fermentação de situações sensíveis capazes de se transformar em crises corporativas de desdobramentos imprevisíveis. Em geral, no Brasil essa preocupação não ocupa o topo as agenda dos executivos em posição de liderança. Freqüentemente, o olhar da direção da empresa está voltado tão fortemente para as metas de vendas, manutenção ou aumento da participação de mercado e retorno aos acionistas que outros temas não focados no curto prazo acabam relegados a um segundo plano.
Crises podem ser evitadas se os radares corporativos estiverem regulados para captar e repelir a aproximação de fator ou conjunto se fatores indesejáveis. A não inclusão dessa atitude pró-ativa e protetora entre as prioridades dos executivos torna remota a possibilidade de que o tema permeie a empresa e se transforme em ativo da cultura interna. Na prática, isso se traduz em empresas enfrentando crises ao sabor de improviso que raramente leva os melhores resultados na defesa dos seus negócios, sua imagem e reputação.
O economista Nouriel Roubini foi um dos poucos que se arriscou a prever terrível turbulência no sistema financeiro internacional quando o mundo ainda vivia exuberância de crédito e incansável expansão produtiva, e predominavam as apostas de que a economia americana faria um soft landing inofensivo no âmbito global. Antes criticado por prognósticos considerados excessivamente sombrios, o hoje reverenciado Roubini diz que seu mérito foi montar um quebra-cabeças cujas peças, segundo ele, estavam disponíveis para quem quisesse ver e tivesse paciência de encaixar. Em outras palavras, a crise financeira era previsível, defende.
Da mesma forma, a maioria das crises corporativas é previsível. Números relativos a crises corporativas ocorridas no Brasil no ano passado e publicadas na imprensa nacional confirmam essa tese. Uma pesquisa realizada a partir da cobertura de nove dos mais influentes jornais diários brasileiros e sete das mais influentes revistas de circulação nacional, durante todo o ano de 2008, aponta que poderia ter sido evitada ou prevista a grande maioria das 402 crises corporativas ocorridas no país e que foram notícia naquelas publicações.
Nada menos de 82% daquelas 402 crises corporativas se encaixam nessa situação. O índice de 82% é similar ai registrado em 2007, quando 77% das 369 crises corporativas noticiadas foram classificadas de igual maneira. O mesmo levantamento aponta ainda que 83% das crises de 2008 ocorreram devido a questões de lideranças das empresas.
No ano passado, problemas no relacionamento com o consumidor responderam por 22% das crises corporativas presentes na imprensa brasileira. Em 2007, questões relativas ao consumidor haviam somado 33% do total das crises noticiadas.
Problemas financeiros de empresas formaram a segunda categoria de crises mais presente na imprensa brasileira em 2008, com 16% dos casos. A seguir vieram as crises vinculadas a aspectos operacionais de diferentes organizações, com 12% do total. Questões trabalhistas totalizaram 9% das crises corporativas noticiadas, vindo a seguir acidentes e questões de concorrência, ambas com 8%.
A mudança dessa postura ao longo dos últimos anos se deve tanto à maior organização da sociedade e do mercado (que passaram a exigir maior transparência das empresas) quanto à preocupação das organizações em atuar de forma mais pró-ativa na defesa de sua imagem e reputação, em linha com princípios de boa governança.
Das 402 crises corporativas ocorridas no Brasil e noticiadas ao longo de 2008, 74% permaneceram apenas um dia na imprensa. Esse índice pouco variou em relação a 2007, quando 78% das ocorrências ficaram apenas um dia no foco dos jornalistas. Contudo, 4,5% das 402 crises corporativas do ano passado ficaram expostas mais de uma semana na imprensa.
* Presidente da Abracom (Associação Brasileira das Agências de Comunicação) e presidente da agência Imagem Corporativa.
FONTE: Abracom